Colheitas

Há um assunto sobre o qual não tenho dirigido os meus registos, as colheitas. Será, por certo, por culpa da vergonha que me impede de falar daquilo que vai frutificando. Quão embaraçoso seria escrever "hoje colhi dois tomates cereja e uma curgete"? Muito embaraçoso. Não é que não me orgulhe do que vou colhendo, mas parece-me tão pouco e tão pouco significativo que o assunto teima em escapar-me entre as mãos. Não tenho uma horta assim tão grande. Na verdade, forçoso será chamar-lhe horta. Chamar-lhe hortinha mais justo seria. Trata-se de uma porção de terra servindo o crescimento de umas quantas cebolas, de umas solitárias beterrabas, que nem da sua própria espécie se alegram na companhia, uns quantos tomateiros apatetados e que constantemente perguntam "onde viemos nós parar, não seria suposto encontrarmos uma horta, um terreno digno onde florir?", uns pimenteiros que ainda nem a família contactaram porque se sentem embaraçados com o ridículo quadrado de terra que lhes calhou em sorte, umas curgetes meio perdidas e que riem constantemente do desterro a que foram condenadas, umas beringelas que reclamam da indignidade da sua condição, umas couves pencas que se sentem enganadas porque alguém lhes terá dito (e não fui eu) que habitariam uma terreno com vista para campos infinitos, uns quantos alhos franceses arrogantes que julgariam vir a ser colhidos pelas mãos de uma princesa de nome Vanessinha ou Francisquinha, dois pepineiros que nem acreditam na existência de uma horta tão pequenina e por isso psicotizaram e julgam agora habitar uma horta do Éden. Portanto, a frustração é tão grande na minha horta que pouco mais resta às plantas do que encontrarem na loucura uma forma qualquer de colmatar as falhas e as frustrações que, no fundo sentem. Ainda assim, de forma tímida e pouco contrariada, e algumas vezes por mera raiva, vão frutificando e fornecendo produtos que, juntos com extremo cuidado para que nenhum venha a arrepender-se, formam aquilo a que, à falta de melhor palavra, poderá chamar-se "colheita". Um exemplo. Ontem, colhi uma couve coração-de-boi, uma couve penca, 2 tomates cerejas, 9 pimentos padrões, umas quantas vagens de feijão, uma curgete, uma beterraba e um pepino (que recusou deixar-se fotografar). Enfim, as minhas plantas podem ser meio malucas e a horta poderá, em certo sentido, não ser bem uma horta, mas tem todo o meu cuidado e o meu carinho.

cabaz da horta


O estacar dos pepineiros

O pepineiro gosta de calor, detesta frio e vento. Caso não haja alternativa, é sempre possível recorrer a uma estufa.

A germinação das nabiças

Plantei as nabiças 4 dias atrás. Debaixo dos fetos que as protegem, os pequenos brotos procuram o sol. O tempo de germinação das nabiças é curto, 3 ou 4 dias e elas aí estão. Quando estiverem um pouco maiores, retirarei os fetos para que comecem a respirar convenientemente. Por enquanto, ficam na incubadora.

germinação nabiça

Sons da horta #2



"Tocam os sinos no torre da igreja", como cantaria João Villaret. Doze. É meio-dia e a horta está viva. Este é um som que se ouve com clareza na periferia das cidades. Na urbe, vai-se perdendo, esbarra nas paredes mais altas e mistura-se com o buliço citadino. Absolutamente indispensável na banda sonora de qualquer horta, é tão telúrico quanto o baque abafado da enxada de encontro à terra.

O nome dos feijões

Para todos aqueles que, ansiosamente, perguntavam "então e o feijão?", pois bem, o feijão já produz. E produz bem. Vai dando à luz com bastante fervor uma quantidade invejável de vagens. Riscadas. Sim, riscadas. Afinal, o feijão é vermelho riscado e por isso as vagens seguem-lhe o padrão. As folhas são iguais às de todos os feijões. Mas vagens e feijões são raiados de vermelho. 

feijão verde

Descobri recentemente que existe uma diferença regional para nomear os vários graus de maturação do feijão. Assim, em Coimbra, de onde sou natural, fala-se em feijão verde, palaú e feijão. O feijão verde consiste na vagem propriamente dita, ainda o feijão se está a formar. O "palaú", ou "palau", trata-se de um grau mais avançado de maturação - o feijão já se formou mas ainda está mole (curiosamente, em todo o Google não encontro uma única referência a este nome, o que me leva a suspeitar que terá um uso muito restrito. Seja como for, garanto que assim se nomeava em minha casa o feijão). Fala-se em feijão quando ele já está, finalmente, seco. Para estas bandas de Vila Nova de Gaia, fala-se em vagem (equivalente ao feijão verde conimbricense), em feijão verde (o tal "palaú" de Coimbra) e em feijão (aqui estamos todos de acordo). Também pode ter acontecido que eu tenha interpretado mal o conceito de "palaú" e, afinal, a palavra aplica-se a outra coisa diferente. Nada garanto. Mas vou investigar melhor.

Semear nabiças

Vamos semear nabiças? Aqui fica uma guia passo a passo de como o fazer.

A mea culpa e as couves pencas

Por estes dias, e depois de encontrar os tomates cereja roídos pelas lagartas, dei comigo a pensar na relação que mantenho com as minhas couves. Correndo o risco de parecer ridículo, e sendo-o de facto, percebi que detesto as minhas couves pencas. Para mim, sempre foram o elo mais fraco da horta - tortas, amarelecidas, roídas, carregadas de pragas e imperfeitas. Durante muito tempo pensei que terá sido uma péssima ideia plantar tantas couves sem que lhe possa garantir digno préstimo. Depois percebi: tudo o que sentia em relação às minhas couves pencas era completamente imerecido. E também percebi: a culpa era minha. As desgraçadas das couves não têm culpa da sua condição de couve, da sua condição de fragilidade ao abrir as asas ao vento. A culpa é toda minha, que deveria cuidar do seu crescimento com todo o carinho. A partir de agora estarei mais atento. Nunca mais as vou regar pensando que estou a desperdiçar água. Nunca mais lhes deixarei crescer ervas até que se transformem em cordas de enforcamento. Nunca mais as deixarei abandonadas às pragas sem lhe que lhes dê o remédio como quem cuida de uma criança. Nunca mais. Talvez assim a minha culpa se cale. Ou não grite tão alto.

couve penca



O que farei a tantas curgetes?

courgettePlantei 4 pés de curgetes. 4 pés. Acontece que a produção da aboborinha é muito maior do que o que estava à espera. 4 pés de curgetes alimentam 4 famílias alargadas e respetivos animais de estimação durante 2 anos, sem que tenham necessidade de ingerir outro qualquer alimento durante esse tempo todo. Já enchi o frigorífico. Já dei à família. E as curgetes continuam a produzir. Verdade seja dita que é uma delícia observar uma plantinha tão cheia de vontade de produzir. Mas tinha de ser assim? Vou começar a oferecer curgetes de forma indiscriminada. Levarei um saco cheio de curgetes e oferecerei, por exemplo, nos centros comerciais. Uma coisa é certa, como andamos todos tão paranóicos ninguém aceitaria. Portanto, vou montar uma barraquinha dedicada à venda de curgetes. E venderei sumo de curgete, também. Bolo de curgete. Gelado de curgete. Doce de curgete. Curgete frita. Curgete assada. Curgete crua. Salada de curgete. Espetadinhas de curgete. Curgete. Curgete. Curgete. Rima com Heliete, que é o nome da minha mãe. Rima com gillette, que já não uso há muito tempo. Rima como croquete. Croquete de curgete: eis um nome vencedor. Croquetes de curgete. Quem resistiria a provar algo com nome assim? Eu. Enfim, que farei eu a tantas curgetes? Ou courgettes? Há quem escreva crujetes. E crugetes. Como se escreve em português-português? Não me faz grande diferença, na verdade. Dava-me jeito é que alguém quisesse ficar com elas. Com algumas, pelo menos.

flor de courgette

Sons da horta #1


Captado ontem, dia 16 de julho de 2013, numa pequeníssima mata ao lado da horta, pode ouvir-se neste primeiro "sons da horta" o vento a passar nas folhas das árvores, pássaros - distinguem-se bem as andorinhas -, um cão a ladrar ao longe, crianças a tagarelar e um carro a passar na estrada. E uma mosca; sem dúvida, uma mosca.

O silêncio dos pepineiros

Não há salada de verão digna do nome que passe sem pepino. Devia haver, inclusivamente, uma lei que proibisse o uso indiscriminado do rótulo "salada de verão" para saladas sem pepino. Pepino é quase sinónimo de verão. O pepino está para o verão como as laranjas estão para o inverno, ou como o outono está para as castanhas, ou a primavera para as flores e para as alergias.

flor pepineiro

Nesta horta à beira da cidade plantada, lancei à terra, corriam os primeiros de maio, 2 inocentes pepineiros. Nos primeiros dias, talvez noites, vorazes caracóis encontraram-nos e roeram-lhes o troço. Por pouco não subiram ao céu dos pepineiros - a meloeira, por exemplo, subiu ao céu das meloeiras, assassinada pelos malditos rastejantes. Por isso mesmo, os pepineiros não cresceram como deviam. Mantiveram-se em silêncio, lambendo as feridas do ataque. Um deles condoeu-se mais da dor do que o outro, e por isso ainda não fugiu à meninice, parecendo querer manter-se pequenino e assustado, como se a vida de pepineiro adulto o assustasse. Floriu e frutificou timidamente - carrega o fardo de uma flor e de um pepino. Ninguém o pode culpar, está a ser um bravo. Muitos de nós nunca mais sairíamos da cama se fossemos atacados por besta assim. O outro, mesmo sem terapia, e certamente depois de passar muitas horas a reflectir nas suas dores e de ter conversado com a corajosa beringela, resolveu esticar-se ao sol, e apresenta já muitos pepinos que um dia formarão uma digna salada de verão.

pequeno pepino

Nunca vi o estacar dos pepineiros. Sempre os vi correr pelo camalhão livremente, se forma descontrolado, frutificando ali e acolá, onde quer que calhasse. Provavelmente, é o que deixarei acontecer, tendo o cuidado de o ir guiando para local mais apropriado ao seu espreguiçar. Mas eu tenho para mim que ele se encaminha, conscientemente, para as estacas dos tomateiros e quer trepar-lhes. Afinal, o pepineiro é uma trepadeira e deve estar mortinho para subir às nuvens. 

pepino

Aparentemente, e a dar fé nesta página, o pepino serve para muito mais coisas do que abrilhantar saladas de verão, e é mesmo um portento nutricional. Eis alguns exemplos das características e usos do pepino:

  • Contém Vitaminas B!, B2, B3, B5, B6, C, Ácido Fólico, Cálcio, Ferro, Magnésio, Fósforo, Potássio e Zinco;
  • É um energético natural, à custa da vitamina B e dos carboidratos;
  • Esfregar rodelas de pepino em vidros evita que embaciem (nunca tentei, mas é o que diz lá. Estranho...);
  • Colocados em rodelas num prato, afasta lesmas e caracóis da horta (esta vou fazer!);
  • Remove a celulite pela esfregação local de rodelas de pepino;
  • Evita ressacas se comido antes de dormir;
  • Substitui a graxa dos sapatos, e além disso repele a água;
  • As vaporizações com pepino são um interessante relaxante e afastam o stress - basta colocar o pepino numa panela de água a ferver e colocar rodelas de pepino, para que solte o vapor;
  • Mata as bactérias responsáveis pelo mau hálito;
  • Devolve o brilho a torneiras ou a materiais de aço inoxidável;
  • Serve como apagador para riscos de esferográfica;
  • O seu sumo é um excelente tónico para fígado, rins, vesícula e dá força aos cabelos e unhas, pelo seu alto teor de sílica e flúor;
  • Elimina a gordura do peixe;
  • Deve ser consumido com casca, porque é aí que concentram substâncias que o tornam de fácil digestão;
  • É um diurético natural e ajuda na dissolução de cálculos renais.

pepino

Enfim, os pepinos servem para tudo e mais alguma coisa. Para mim, são apenas os meninos tímidos e silenciosos da horta, e que brevemente farão uma maravilhosa salada de verão.


A vida breve das galinhas

Mesmo ao lado da horta, os avós da S. têm o seu galinheiro; já está velho e a precisar de obras, mas ainda tem galinhas. A contragosto da mulher, o avô da S. comprou galinhas ainda pequenas e alimentou-as até à morte. A morte aligeirou-se a chegar, na verdade. O pai da empregada encontrou os galináceos pela madrugada e cortou-lhes o pescoço. Nenhum sobrou. Foi coisa combinada, não se tratou de assalto furtivo. À empregada dava-lhe o fanico se levasse a faca ao pescoço das galinhas, e por isso pediu ao seu pai que vestisse o manto da moribunda. Este vídeo foi filmado nas vésperas da madrugada fatal.



Um dia na horta

A mãe da S. e a sua mãe - não tem como confundir: a minha sogra e a sua mãe -, andaram a cuidados no cemitério, florindo saudades entre campas. Enquanto isso, no lugar onde se celebra a vida das hortaliças, preparei terreno para semear nabiças, sachei e arranquei ervas com as mãos; enfim, compus tudo aquilo que a passagem do tempo cansando vai. 
canteiro
Preparação do canteiro para a sementeira da nabiça
Planeio semear nabiças em breve. Já o terei dito, as nabiças são uma das boas coisas que o inverno nos traz, a contragosto da S., que não se revê em sabor assim, preferindo, por exemplo, filhoses de abóbora menina quando o frio encontra a carne. E esta foi uma falha: não plantei abóbora menina. Tenho por lá umas abóboras, mas não lhes vejo jeito de serem meninas. Quando crescerem, aposto, mostrar-se-ão fulgorosas matronas, daquelas que esperam sentadas no rebate da casa e que conversam contentemente quando o céu de abre em modos e se riem muito das tonterias de um distante parente francês ou brasileiro. Estou eu inventando que sei, mas nada sei. Não distinguirei uma abóbora menina de uma outra de qualquer idade. Verdade é que tenho lá abóboras, e ainda as hei mostrar em fotografia, para ver se alguém sabe mais do que este que vos escreve. E que crescidas! Se lhes der na gana, e a água abundar ao troço, galgarão o terreno, cuja área pouco tem de desprezível, e arribarão ao telhado do alpendre vizinho, para aí chocar abóboras como bolas de Nivea - aquelas antigas que dantes anunciavam as praias. 
onion
Cebola
Deixemo-nos de prosa desperdiçada. Preparei terreno para sementeira, dizia eu. E planeava eu explicar como o fiz. Parece-me, todavia, o assunto tão pouco assuntável que o direi em duas penadas. O terreno onde planeio semear nabiças é a porção de terra até agora pertença das alfaces, que cresceram e abandonaram a terra. Não que o tivessem feito pelo próprio pé, porque pé de alface, que se saiba, não caminha. Outros pés e outras mãos trataram de as levar para um prato, onde o sal e o azeite, porventura um pouco de orégão, as compuseram a jeito de comer, e por breves instantes habitaram a barriga das pessoas.
feijão verde bebé
Feijão verde bebé
coração couve
Couve coração
A primeira coisa que fiz foi cavar o terreno. Mas cavar com convicção, não é como quem faz cócegas na barriga de alguém. Cavei com uma daquelas enxadas mais pesadas, para que a lâmina ferisse bem a terra. Felizmente, a terra ainda está mansa, mantém humidade e leveza e não se tornou um trabalho tão doloroso como o que esperava. Depois de ter cavado e revirado a terra, passei o ancinho para apanhar toda e qualquer erva, não fosse a malandra voltar a enraizar-se. Numa sementeira é imprescindível cavar a terra. Deste modo, torna-se macia e acolhe amavelmente a semente. Provavelmente, também misturarei um pouco de composto, para que fique mais enriquecida, mas nem lhe vejo grande necessidades disto, porque a terra ainda está rica; afinal, as alfaces não foram assim tão gulosas de nutrientes. Ainda tratarei de sinalizar por meio de estacas e cordas o canteiro, não vá algum pé incauto estragar a obra. Depois disso, espalharei a semente e protegê-la-ei do sol forte com a ajuda de fetos. Regarei com muito jeitinho e esperarei que a semente germine e se mostre ao mundo como é esperado que se mostre. Nunca semeei nada por ali e temo que terei grande problemas com as ervas daninhas, que recebam e crescem de uma forma que nunca vi em lado nenhum. Se tudo correr bem, o inverno trará deliciosas nabiças. A jornada é longa. Comprei as sementes de nabiças no Continente e custaram 99 cêntimos. Nada caras, portanto. São fáceis de encontrar, basta ir àquele cantinho das flores e da jardinagem.
pimento verde
Pimento jovem
Explicava eu lá atrás que também sachei e arranquei ervas com as mãos. As ervas daninhas e invasoras têm sido uma brutal dor de cabeça. Se me distraio um pouco, engolem as curgetes e os tomates num abrir e fechar de olhos, e tudo se transforma num temível matagal, propício para que raposas e coelhos as habitem. Agora já estou a exagerar.
morango selvagem
Morango silvestre
pimento padrão
Pimentos padron 
As curgetes apresentam já uma produção interessante (4 pés de curgetes produzem cerca de 10 curgetes por semana). O tomateiro cereja, o único que tenho, mostra-se carregadinho de tomates. Os tomateiros coração de boi vão trepando pelas cordas e pelas estacas, espalhando cachos de tomates que ameaçam avermelhar-se esplendorosamente quando agosto chegar. Os pimenteiros mostram-se generosos e em breve oferecerão pimentos. As beterrabas estão prontas a apanhar, e é o que vou fazendo. Couve penca há imensa, embora continue a ser brutalmente atacada por tudo o que é bicharada. Os pepineiros estão grávidos de pepinos. O feijoal parece uma infantário de feijão verde bebé. As cebolas estarão para breve. Enfim, a horta de julho e de agosto. E que bem sabe o fruto que cultivamos!
barba de milho
Barba de milho




Visitantes da horta #5

feijão rasteiro flor
Flor de feijão rasteiro riscado e um turista acidental

Desconheço o nome deste inseto que recentemente visitou a horta. Quis passar despercebido e por isso vestiu-se de camuflado hortícola. Não lhe sei o nome. Mas que se disfarça bem, disso não há dúvida alguma. Conseguem encontrá-lo?

A flor da beringela

Das plantas que tenho na horta, as beringelas foram as que demoraram mais tempo a florir e frutificar.

Ferramentas da horta

As ferramentas são objectos que o cérebro usa quando quer fazer alguma coisa. A primeira ferramenta do cérebro é, obviamente, o corpo; e, usando o corpo, o cérebro utiliza outras ferramentas ainda, empilhando ferramenta atrás de ferramenta. Por exemplo, o cérebro usa olhos que usam óculos para controlar o estado da horta. Os óculos não são, obviamente, uma ferramenta específica para a horta. Outras serão. Por exemplo, a enxada. Por exemplo, a tesoura de podar. Por exemplo, a mangueira para regar. Se formos a pensar bem, são imensas as ferramentas que usamos na horta. E são tão imensas que algumas casas se especializaram a vendê-las. Começam na navalha de enxertia e vão parar ao tractor. Das mais simples para as mais complexas. Das mais primitivas para as mais modernas. Das mais rústicas para as mais sofisticadas. Para cuidar de uma horta como a minha, não são necessárias ferramentas muito sofisticadas. Já por lá andou um tractor, contratado, para preparar a terra. Mas foi vez única. Não é ferramenta que use. As minhas ferramentas são muito simples. Ainda assim, são bastantes. Elencá-las de cabeça não é fácil, e ainda não me dei ao trabalho de ir apontando o que uso. Faz sentido pensar que a ferramenta de excelência da horta seja a enxada, logo seguida do regador, já que a horticultura é, sobretudo, terra e água. Caso houvesse a imagem de um horticultor na caverna de Platão, ele, com grande probabilidade, portaria uma enxada ao ombro e no seu cabo estaria enfiado um regador. Azul. Ou vermelho. Aproveitando o oco do regador, outras pequenas ferramentas retiniriam no caminho para a horta. Mas vamos a ver se me lembro. Enxadas. 2 ou 3 diferentes. A maior serve-me pouco, uso-a quando é preciso cavar fundo. A média uso-a para plantar e acertar os canais de água e para sachar erva em espaço mais desafogado. Quanto à pequena,  o sacho - ou sachola -, uso-a para sachar com cuidado por entre as plantas sem correr o risco de estragar nenhuma. Desta família das enxadas, também uso o ancinho para quando a erva sachada é muita e precisa de ser catada para um monte. Depois temos o material para a rega. O regador, o mangueira, os bidões de água, uma união para as mangueiras quando a distância é grande e a mangueira é curta, e um ou outro balde, incluindo um deles feito com a embalagem do detergente da máquina. Isto é o essencial, depois há uma variedade de pequenas e grandes coisas: facas, tesouras, martelos e marretas, cordas... Felizmente, o ferramentário do avô da S. está bem apetrechado, senão onde iria buscar eu tanta coisa? Podemos ainda falar de outro tipo de instrumentos que, não sendo exactamente ferramentas, tornam-se imprescindíveis; falo de luvas, de umas boas botas, do creme protector solar (este calor não brinca), de um boné, de uma garrafa de água... e a lista continua. Moral da história: quem quer cultivar uma horta deve precaver-se com bastantes ferramentas e também com um lugar generoso onde as guardar. 

enxadas para a horta
Uma família de enxadas: enxada média, sachola, enxada grande, ancinho
ferramentas horta
Várias ferramentas para a horta: tesoura de podar, bidão aspersor, cordel, marreta (serviu para enterrar estacas), luvas, tesoura (sim, esta é uma tesoura da escola...), botas

Flor de feijão rasteiro riscado

feijão rasteiro riscado
Flor de feijão rasteiro riscado
Apresento-vos a flor do feijão rasteiro riscado. Só quando fotografava me apercebi da quantidade de piolhos ou de pulgões (não sei qual deles será, ou sequer se será um destes bichos...) que anda por ali. Vou estar atento, não vá criar a horta mais bicharada do que feijões. É linda. Sim, senhores.

O meu grande coração de boi

Quando era miúdo, um dos meus pratos preferidos era uma belíssima salada de tomate, daquele ainda a acabar de amadurecer; uma salada feita ao mínimo, apenas com sal e com azeite. Vim a descobrir que o tomate, aquele tomate em particular, que ficava tão bem nas minhas saladas infantis, se chama tomate coração de boi. Este ano, plantei uns quantos pé; seis, para ser mais exacto. Começam agora a frutificar timidamente. Na semana passada, detectei por lá um tomate infante. Pelas minhas contas, o pequeno coração ainda tem muito por onde crescer. Tenho, porém, a convicção que logo que amadureça provará o sabor do sal e do azeite. Nem de outra maneira poderá ser.

coração de boi
Tomate coração de boi ainda pequeno. Mais será um tomate coração de bezerro. Lá chegará.

Visitantes da horta #4

pimenteiro flor
A flor do pimenteiro e o mosquito
Não há hortas sem mosquitos; aqui, pousado junto à flor do pimenteiro.

Sementeiras de julho

Para estas bandas, e digo Vila Nova de Gaia, Portugal, está um calor que não se pode. Não se pode mesmo. Semear em dias assim, só mesmo ao romper do dia ou depois do sol cair. Se querem mesmo semear, arranjem um espaço fresquinho, arejado e longe do calor. A Casa César Santos, casa de sementes de Matosinhos, recomenda no seu catálogo as seguintes sementeiras para julho: agrião, aipo, alface, beterraba de mesa, brócolos, cenoura, chicória, coentros, curgete, couve-flor, couves diversas, espinafres, feijão, funcho, manjerico, milho doce, nabiça, nabo, pastinaga, penca, rabanete, repolho e salsa.

Já o famosíssimo Borda d'água recomenda: agrião, alface, beldroega (!), cenoura, feijão de trepar e anão, nabo, rabanete, repolho, salsa, couves de Bruxelas, nabo e flor (?). Recomenda ainda que se regue ao amanhecer ou ao entardecer (pudera!). Para quem tem jardim, recomenda a sementeira de amores-perfeitos, calêndulas, cinerárias... 

Enfim, a escolha é mais do que muita. Quanto a mim, já vou ficar todo contente se conseguir semear um canteiro de nabiça. Para mim, é das melhores coisas que o inverno traz.

Duas orgulhosas pencas, duas beterrabas e quatro curgetes

Porque nunca falei do assunto, pelo menos que me lembre, parece a colheita uma qualquer desimportância. Assim não é. Um momento de orgulho nasce no preciso instante em que da terra tiramos, já  maduro, o que nela plantamos. Uma comoção. Um tremor miudinho. Confesso, nunca tinha percebido a carga emocional de uma colheita. E, no meu caso, trata-te de uma pequena porção de terra, de uns pés de alface, de uns pés de couve, de uns quantos tomateiros e pouco mais. Não se trata de campos imensos, cuidados de madrugada ao anoitecer. É um nada. Uma coisa pequena. Mas a emoção está lá. E sente-se. Tenho colhido alguns frutos do trabalho. Começou por ser na forma de alface - primeiro a branca, logo depois a roxa -, e agora diversificou-se e assumiu outras formas. As colheitas de julho prometem. Nesta quarta-feira que passou, colhi duas orgulhosas pencas, duas beterrabas e quatro curgetes. Uma alegria.

curgetes beterrabas pencas
Pencas, beterrabas e curgetes

Glass-K, o substituto biológico do sulfato

De acordo com o Luís, o tal que capou os tomates, os tomateiros estariam a precisar de sulfato, para os proteger do míldio e outros que tal - e enumerou um rol de doenças dos tomateiros que eu não consigo reproduzir. "Tens de sulfatar os tomates senão isto estraga-se tudo, e é uma pena", disse-me ele, mais ou menos nestes modos. Como não sou especialista, nem para lá caminho, nas dores e no sofrimento das hortícolas, acato com solenidade toda e qualquer sugestão que enriqueça e melhore o meu trabalho, e que eu muito agradeço. De acordo com o que a memória me dita, sempre vi os tomateiros cobertos por uma tinta azul, com um cheiro muito característico - o sulfato. E lembro-me de ver o meu pai com uma máquina sinistra às costas, e que lhe emprestava um ar de personagem de ficção científica, com os seus tanques de oxigénio que serviam, simultaneamente, para respirar e para combater os malvados dos extraterrestres. Era a mítica máquina de sulfatar. Quando se falava em sulfatar lá em casa, logo um aroma característico me chegava às narinas; e já sabia: naquele fim de semana, nada de dormir até mais tarde, tudo rumava para os campos e sulfatava-se de manhã ao entardecer. Era este azulado que esperava encontrar quando fui à loja dos meus amigos da Sograpa perguntar se tinham sulfato - a pergunta é estúpida, trata-se de uma loja de produtos para a agricultura... Perguntei também se era um produto tóxico e, a ser tóxico, se haveria alternativa biológica. Recomendaram-me o Glass-K. Disseram-me que mantinha as mesmas funções do sulfato e, além disso, também favorecia a floração e a frutificação e isso tudo. Trata-se de um indutor de resistências com potássio, e isso parece-me coisa de respeito para se dizer de um produto biológico substituto do sulfato. Procurei no site que vem na embalagem e também fiquei a saber que o produto é composto por potássio e fósforo e que favorece os açúcares para o fruto... A mim parece-me coisa boa. Durante a tarde andei entretido a borrifar toda a minha horta, incluindo couves, alhos, cebolas, tomates, pepinos, curgetes e tudo o que mais por lá anda e desanda. Para minha enorme tristeza, o produto não tem aquela magnífica, e quase mítica, cor azul do sulfato. Não tem mesmo cor nenhuma. O Glass-K é incolor e ninguém percebe que a horta está "sulfatada". Os produtos biológicos ainda tem muito para aprender com o produtos tradicionais, e a cor é uma delas.

Sulfato biológico
Glass-K, o substituto biológico do sulfato

Os insetos e as flores da salsa



Encontrei estes insetos vestidos com roupa marcial a esvoaçar muito contentemente nas flores pequeninas e brancas da salsa. Não lhes sei o nome.

Capar tomates

No sábado que passou, capei os tomates. Quando me foi anunciado que era uma necessidade imperiosa, julguei que seria insustentavelmente doloroso. Capar tomates revelou-se uma actividade tranquila, bem mais fácil do que esperava, embora me tivesse comovido a alma olhar para tanta e boa rama desperdiçada. O Luís, o tio da S., que me ajudou a capar os tomates, já antes o fizera ao pai e a uns quantos primos que lho haviam pedido. Julgo até que terá capado os tomates à irmã. É, portanto, um capador de tomates credenciado. E como capar tomates? O processo é bastante simples, e depois de me ter mostrado uma vez como se fazia e de me ter explicado, julguei-me capaz de me aventurar nos segredos de capar tomates. Capar tomateiros consiste em cortar todos os ramos, os chamados "ladrões", que desviam o fulgor do tomateiro, impedindo que os nutrientes cheguem aos frutos de forma a crescerem na sua máxima força. A variedade que tenho plantada é tomate coração de boi, uma variedade que cresce enorme como os corações generosos. Tenho também por lá um tomateiro cereja, mas não vi grande vantagem em capá-lo, porque os tomates são muito pequenos e livremente crescem sem que os ramos ladrões venham a perfilar-se como uma ameaça ao pequeno fruto. O Luís também me ajudou a estacar de forma mais eficiente os tomateiros. As estacas que antes enfiara na terra pareciam meninos de coro ao lado dos robustos troncos que agora figuram na horta. Resta-me estender cordas para que os tomates se segurem convenientemente. Enfim, tratar de tomates é coisa séria. Deixo uma ilustração para que se perceba o processo, pedindo desculpa pelo atrapalhado do traçado. Na ilustração, apenas o tronco é poupado, e todos os ramos secundários são capados. Poderemos ser mais perdulários e deixar até ao máximo de quatro troncos para frutificar. Não é absolutamente necessário capar os tomates, e poderemos, se assim o entendermos, deixar crescer livremente a planta. Há muita gente que assim o faz. O meu pai, por exemplo, nunca capa tomateiros, e tem bons resultados.

tomates capados
Capar tomates. A verde e a vermelho, tomates em diferentes fases da maturação; a amarelo, flores; a azul,  ramos capados.

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